terça-feira, 3 de março de 2009

PANTANAL - Gente, tradição e história, de Augusto César Proença.

PROENÇA, Augusto César. Pantanal: gente, tradição e história. 3ª Ed. Campo Grande, MS: Ed. UFMS, 1997. 168p.

O pesquisador corumbaense Augusto César Proença nos traz um livro de nome inadequado. Não se trata de um ensaio amplo sobe o pantanal mato-grossense. Melhor seria chamá-lo uma história afetiva de uma parte do Pantanal, e da família que o ocupou, a família do autor.

O livro se divide em duas partes. A primeira, até a pg. 59, é uma rápida história Standand de Mato Grosso. A segunda parte é melhor.

O Pantanal não é uno. Divide-se em nomes quase humorísticos, como o pantanal de Barão de Melgaço, ou o de Nagileque. Noutros países as pessoas são imortalizadas por seus sobrenomes. Já o seu Nheco nunca imaginou que seu nome seria esquecido, mas seu apelido entraria para a geografia: pantanal da Nhecolândia.

Região maior que Sergipe. Seu Nheco foi o dono dela, inteirinho, de 1880 a 1909. Mas não se o pense como um coronel clássico e aí vem o interesse do livro. A história da Nhecolândia começou com a chegada de um certo português Leonardo Soares de Souza em 1769. Fracassou nos negócios e pediu terra. Terra era muita, não valia nada. Por muito tempo ninguém imaginaria em colocar hotéis ecológicos num lugar que ninguém chamava então de paraíso da natureza. Era só terra de tuiuiús, jacarés e outros bichos que não serviam para nada, boa apenas para criar gado extensivo. E o preço da carne rastejava, quase zero. Seu genro João Pereira Leite fundou a Fazenda Jacobina, quase auto-suficiente, visitada pelo estrangeiro Hercules Florence em 1827.

João Pereira Leite abrigou o Dr. Sabino, revoltoso derrotado da República Bahiense, e esta amizade com um inimigo do Imperador lhe tirou o Baronato.

João Pereira Leite só tinha uma filha. E essa fugiu com Joaquim José Gomes da Silva, um caixeiro-viajante filho de um padre. Mesmo casados, tiveram de morar longe. Conseguiram terras – as terras não valiam nada. O Imperador tornou Joaquim José Gomes da Silva o Barão de Vila Maria, atual cidade de Cáceres. Até que veio esse desastre conhecido como Guerra do Paraguai. Todo mundo afrouxou. Os comandantes de Corumbá e do Forte de Coimbra fugiram dos paraguaios. O mesmo fez o nosso Barão, que fugiu para o Rio.

Morreu e seu filho Joaquim Eugênio Gomes da Silva sem dinheiro subiu os rios em barcos movidos a um pau que bate no fundo do rio chamado zinga e alguns índios e a esposa atrás dos restos da fazenda do pai. Encontra e funda a Fazenda Firme. Chama uns parentes, dá terras. A carne de gado era tão barata que eles vendiam só o couro para os comerciantes estrangeiros em Corumbá, para comprarem tecidos e o pouco que não produziam. Era uma vida difícil, até pelos ataques das onças.

A pobreza espalhou uma família por um território maior que Sergipe e que ganhou não o nome de Joaquim Eugênio, mas seu apelido: seu Nheco.

Os grandes ausentes dos livros são os índios. Será que a Nhecolândia era realmente vazia de gente? Não havia um ser humano lá? Nesse, caso, qual a atitude da família do autor diante deles?

O livro resgata um tempo em que a terra só tinha valor de uso, não valor de troca. O mesmo para a carne. Assim alguém dono de terras do tamanho de um estado era bem menos rico que se pensaria. E O autor menciona a solidariedade entre todos, naquele tempo. Quando o preço da carne subiu, a solidariedade sumiu. Sic Transit.


De leitor para leitor

Livro: Pantanal: gente, tradição e história, de Augusto César Proença.
Assunto/Personagem Principal: parte do Pantanal Mato-grossense – a Nhecolândia.

PARA QUEM ESTE LIVRO INTERESSA MAIS:
Mato-grossenses e sul-mato-grossenses.
Muito interessados em história do Pantanal..
Historiadores marxistas procurando exemplos em que sua teoria se encaixa.
É livro para pessoas com interesse específico na região ou para fanáticos por história do Brasil (caso deste resenhista)
.
O QUE VOCÊ PODE ESPERAR DESTE LIVRO:
Boas histórias da vida tradicional no Pantanal.

QUANTIDADE DE HORAS DE ENTRETENIMENTO: 4 hs
.
PODE SER LIDO em ônibus/metrô ou em filas em pé. É livro para ler rápido.

O QUE ESTE LIVRO MAIS TRAZ PARA VOCÊ:
Informação sobre o Pantanal no século XIX.
.
PÚBLICO PARA AS HISTÓRIAS QUE VOCÊ CONTARÁ:
público feminino (histórias de sexualidade e família): sobre os perigos que as crianças corriam no mato. Sobre a fuga de uma moça e um rapaz para casar escondido do pai.
público masculino (poder, política e economia): histórias sobre a economia da época, a chegada dos grandes comerciantes a Corumbá e a evolução familiar da região.


TRECHO


“Daí chegou a vez do Lopes, que retirou a camisa e, por detrás de uma forquilha que um pé de maminha de porco formava, abanou a camisa feito toureiro e desafiou a onça a partir em cima dele. A fera atacou, mas teve o azar de esbarrar na forquilha que protegia o vaqueiro. Armou o pulo. Ficou de pé e abraçou a forquilha e a camisa xadrez que o vaqueiro lhe abanava para dar tempo de, entre os dois paus da forquilha, bem no rumo do coração, enfiar a faca com toda a raiva daquele momento, para que a fera abraçasse e cravasse a lâmina no fundo do peito, soltando um só gemido e caindo de lado para estrebuchar e receber as mordidas dos cachorros, estatelada naquele chão manchado de sangue” (p112).

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