sexta-feira, 6 de março de 2009

Cuiabá - paisagens e espaços da memória, de Sônia Regina Romancini.


ROMANCINI, Sônia Regina. Cuiabá – paisagens e espaços da memória. Cuiabá: Cathedral publicações, 2005. (Coleção Tibanaré, vol 6). 176p.

Um livro sobre a história urbanística de Cuiabá pode nos ensinar a enxergar algo melhor em todas as cidades? Ou em nossa vida pessoal? É livro que se pode dizer despretensioso. Historia a capital do Mato Grosso, depois escolhe pontos significativos dela e prossegue baseado em pesquisas sobre como os habitantes locais percebem a mutação de seu espaço.

Cuiabá nasceu singular. De um riacho acarpetado de pó de ouro que um certo paulista descobriu em 1719. À beira do riacho nasceu uma povoação e uma igreja, de São Benedito, até hoje existente. Depois a estagnação econômica, fazendo-a por séculos parecer uma aldeia do Minho. No começo do século XX, o afrancesamento, as lojas de nome parisiense. As boas famílias e a ocupação social dos espaços públicos. Pelo meio do século, a prioridade desta nova engenhoca, o automóvel. A falta de esgoto transformando os riachos em esgotos, inclusive o riacho fundador. As autopistas ocupando as margens de rios impermeabilizando o solo e aumentando a temperatura. A prioridade da multiplicação de capital destruindo os prédios antigos e aumentando os gabaritos. O conforto dos automóveis exigindo mais asfalto e aumentando mais ainda a temperatura, junto com arrancamento de árvores. A população se fechando em casa e abandonando os espaços públicos, tomados por camelôs e doados pelo poder público a diversos fins particulares e governamentais. Finalmente a revalorização dos cacos do que restou, com a criação de centros históricos, leis de tombamento e centros culturais.

Podia ser a história de qualquer cidade do país. Somos muito parecidos. Ridiculamente parecidos. E não só as cidades. O trecho citado abaixo explica bem. Somos todos iguais, movidos a Macdonald’s e subordinados a juros de banco, todos nós, homens e cidades. A recente busca do passado é uma busca da singularidade. A história do riacho Prainha que em meio século se transformou de riacho fundador em esgoto soterrado sob uma avenida de pista quádrupla é a mesma história do Anhangabaú paulista, do Carioca do Rio, do Pajeú de Fortaleza, qualquer. E a busca da singularidade pode ser perigosa. Pode ser: sou singular porque sou branco / por que sou católico / por que sou negro / por que sou gaúcho. A singularidade pode ser excludente.

A prioridade a uma minoria da população que detém poder político e tem dinheiro para conseguir recursos muitas vezes públicos para construir prédios; a manipulação dos recursos públicos para construir infra-estrutura para esse lucro pessoal; o desrespeito ao não possuidor de carro, obrigado a se apertar em calçadas esburacadas; a privatização do lazer e dos espaços de convivência, tudo o que vemos está sempre ali, em microcosmo. Livro quase para especialistas mas que pode ter leitura ampla para quem se interessa pela cidade onde mora.

DE LEITOR PARA LEITOR

Livro: Cuiabá: paisagens e espaços da memória, de Sônia Regina Romancini.
Assunto/Personagem Principal: Cuiabá – sua história urbana.

PARA QUEM ESTE LIVRO INTERESSA MAIS:
Mato-grossenses.
Pessoas interessados na história de Cuiabá.
Interessados na evolução urbana das grandes e médias cidades brasileiras.
Interessados no efeito dos automóveis e da especulação imobiliária nas cidades.
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O QUE VOCÊ PODE ESPERAR DESTE LIVRO:
Uma evolução histórica bem delineada.
Opiniões populares sobre esta evolução.

QUANTIDADE DE HORAS DE ENTRETENIMENTO: 6 hs
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DEVE SER LIDO em escrivaninhas, poltrona ou na cama. Exige alguma atenção.

O QUE ESTE LIVRO MAIS TRAZ PARA VOCÊ:
Possibilidade de fazer paralelos com a evolução da sua cidade.
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PÚBLICO PARA AS HISTÓRIAS QUE VOCÊ CONTARÁ:
Público feminino (histórias de sexualidade e família): sobre a piora na qualidade de vida das grandes cidades e perda dos laços afetivos de vizinhança.
Público masculino (poder, política e economia): histórias sobre a própria evolução urbana e a especulação imobiliária.

TRECHO

“Numa abordagem sobre a memória das cidades, Abreu salienta que, ante os acontecimentos do século XX, com os progressos técnicos e científicos, as guerras, a fome, entre outros, as sociedades buscam novas visões de mundo, vivendo mais o presente, desconfiando do futuro e revalorizando o que construíram em tempos passados

Segundo Abreu, ante a homogeneidade do espaço global, cada lugar procura na singularidade a sobrevivência e a individualidade, sob esse aspecto:

O passado é uma das dimensões mais importantes da singularidade. Materializado na paisagem, preservado em ‘instituições de memória’, ou ainda vivo na cultura e no cotidiano dos lugares, não é de se estranhar, então, que seja ele que vem dando o suporte mais sólido a essa procura de diferença.” (p58)

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